A moeda Real (BRL) foi criada pelo governo brasileiro em 1994, após anos de combate a inflação. Na próxima semana, o Real irá completar seu aniversário de 26 anos, em um momento conturbado para sua estabilidade de valor.
De fato, quando o Real foi criado, o Brasil atravessava bons anos de dureza para a moeda. Como meio de pagamento, todas as moedas que vieram antes, e não foram poucas, deixaram a população brasileira em apuros. Contudo, em 1994, o governo conseguiu estabilizar a inflação com uma nova divisa, nascia assim o Real (BRL).
Seu lançamento oficial, apesar de ter começado a ser utilizado antes disso, foi em 1.º de julho daquele ano. Na época o presidente era Itamar Franco, que anunciou a entrada do Plano Real na vida dos brasileiros. Vinte e seis anos após sua entrada, os velhos desafios retornam para assombrar os brasileiros, mesmo aqueles que nunca acompanharam o fatídico episódio.
Na última sexta, uma visão de vários senadores do Brasil foi compartilhada pela Agência Senado. Muitos compartilharam suas visões para que o Brasil retome o crescimento, pensando que o Real deve ser uma moeda importante agora.
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Moeda brasileira em uso há 26 anos, aniversário do Real chega em momento recheado de desafios
Quem tem menos de 26 anos não sabe como era a realidade do Brasil antes do plano real, quando a inflação do país vivia momentos surreais. Em alguns meses, a inflação chegava a ser de 100%, com um produto no mercado podendo sofrer remarcações de preços várias vezes durante um mesmo dia.
Para piorar a grave situação, os governos da época não sabiam como arrumar a confusão, e em 1992, Fernando Collor realizou um confisco da população brasileira. O episódio, marcado na memória de quem perdeu seu dinheiro de um dia para outro, é apenas mais um dos pontos a ser esquecidos.
Em 1992, por exemplo, a inflação acumulada em 12 meses foi de, pasmem, 1.119%. Com a saída de Collor, Itamar Franco assumiu interinamente a presidência, conduzindo ações que levaram a criação do Plano Real em 1994.
De acordo com o atual senados Antônio Anastasia (PSD-MG), o momento assolou os brasileiros. O senador lembra que não havia como investir no país, nem realizar projeções de longo prazo.
“Não há flagelo maior para uma economia do que a inflação. Sou do tempo em que ela alcançava 80% ao mês. O preço era um pela manhã, outro à tarde e à noite outro diferente, para o mesmo produto. Não havia planejamento que funcionasse, nem investimento”
Com hiperinflação, medidas drásticas agravaram problema
Certamente os governos que encararam o período pós-ditadura no Brasil não estavam preparados para enfrentar o turbilhão que estava por vir. A ditadura que acabou em março de 1985, oficialmente, deixou para trás uma economia arrasada, com alta inflação para os primeiros governos civis.
Até que o plano real fosse criado, o Brasil teve inúmeras moedas, Cruzado I e II, cruzado Real, entre outras. Além disso, viu os governos cortarem zeros das moedas, confiscarem poupança, imprimirem mais dinheiro para incentivar consumo e até o congelamento de preços, todas essas medidas em vão.
Em 2020, o plano real, mesmo com seu aniversário de 26 anos nos próximos dias, enfrenta novamente desafios. Isso porque, o mundo atravessa uma crise sanitária e econômica, que põe em cheque a confiança da população no dinheiro fiduciário nacional.
Em entrevista para a Agência Brasil, o economista Edmar Bacha, um dos formuladores do plano real, afirma que o momento é sério. Contudo, mesmo com alto desemprego e grave desvalorização frente ao dólar, o real deverá se comportar bem no curto e médio prazo.
A explicação seria que o Real brasileiro não tem sofrido com inflação em 2020, ano que completa seu aniversário de 26 anos.
Principais pontos são taxas de juros e meta anual da inflação, afirma economista
Para Edmar Bacha, é importante entender até quando o banco central vai ter que manter baixa a taxa de juros. Além disso, sua preocupação é entender qual será a política de metas de inflação.
Instituída em 1999 no Brasil, o sistema estabelece que a inflação medida pelo índice IPCA deve ter como centro da meta de 4,5% ao ano. Essa medida é importante para não deixar a inflação escapar do controle, o que o economista alerta que não pode ser perdido.
O senador Álvaro Dias (Podemos-PR) julga que o governo teria que ser “muito incompetente” para permitir a volta da inflação. Dias acredita que reformas estruturais como a tributária e administrativa podem ajudar a retomada do crescimento.
Após a pandemia, o que o governo esperava economizar em 10 anos, foi gasto em 2020. Portanto, novas medidas terão que ser implementadas para uma eventual retomada da economia.
“Facilidades de crédito atrapalham combate à crise”, apontou consultor do Senado Federal
O Banco Central do Brasil tem realizado uma grande quantidade de medidas para combate a crise. De acordo com o consultor do senado Allan Coelho Duarte, “o crédito não vai resolver o problema, apenas agravá-lo“.
Isso porque, no último dia 23 o BC anunciou pacote de medidas de aproximadamente R$ 210 bilhões. Ao abrir a torneira dos gastos, Allan acredita que o socorro pode ser um remédio para o estrago já feito. Contudo, lembra que toda a população irá pagar por isso no futuro.
No futuro pós-pandemia, o Brasil certamente não terá dinheiro para gastos públicos, e já há quem defenda a austeridade fiscal. O senador Anastasia defende que não poderemos ter um governo que gasta em excesso e nem inflação quando a crise sanitária se acalmar.
Nesse ponto vários senadores concordam que deverá ter restrição de despesas públicas e o estabelecimento de prioridades nos gastos públicos. A chamada austeridade fiscal tem sido defendida inclusive durante a pandemia.
O ex-presidente do Banco Central, Affonso Celso Pastore, defende que não há mais espaço para gastos públicos no período pós-pandemia. Para ele a principal fragilidade que o real enfrenta em seu aniversário de 26 anos é justamente o aumento da saída de capitais estrangeiros aumentando o risco associado as contas externas e fiscais.
Devemos imprimir mais real? Alternativas heterodoxas são consideradas por alguns dentro do Senado
Ainda que os senadores acreditam que o momento é de enorme desafio, alternativas heterodoxas como a teoria monetária moderna tem tido espaço na linha de combate a crise. Neste ponto alguns acreditam que a impressão de moeda não deve ser descartada principalmente por o Brasil ter enormes desigualdades sociais e regionais.
Os desafios para o real são enormes e seu aniversário chega para lembrar a divisa do duro momento. Neste ano a moeda já perdeu 36% de valor em relação ao dólar, e 36% em relação ao Euro.
Além disso, desvalorizou gravemente em relação ao Bitcoin, principal moeda digital que poderia funcionar como alternativa ao real brasileiro caso a população opte por sair do sistema financeiro nacional. O preço do Bitcoin subiu 69% em relação ao Real, mostrando que a criptoeconomia poderia ajudar os brasileiros como reserva de valor.
Temendo um escape, o Banco Central já anunciou novas medidas para tentar manter o dinheiro da população no Brasil. O sistema de pagamentos instantâneos, que contará com o PIX e Open Banking, é a principal medida que o BC institui para manter a população utilizando o real brasileiro.
Para o economista austríaco Fernando Ulrich, o comportamento do Real no ano, com intensa volatilidade, já parece com o do Bitcoin. Ou seja, a moeda brasileira é uma das piores do mundo em 2020, com uma extrema volatilidade em seu valor.
USDBRL 5,48.
A desvalorização, hoje, já nem preocupa tanto (nos "acostumamos"). O pior de tudo é a extrema volatilidade da moeda.
A derrubada dos juros eliminou o carrego, depreciou a moeda e fez sumir a liquidez do mercado.
Resultado: alta vol no BRL. Comparável ao bitcoin. pic.twitter.com/l3IOtKIWLe
— Fernando Ulrich (@fernandoulrich) June 26, 2020
No aniversário de 26 anos, será que a população ainda acredita tanto no Real, a ponto de ter apenas essa moeda em suas carteiras? Cabe o destaque que até maio de 2020, o real já perdeu mais que 519% na inflação acumulada desde 1994, medidos pelo IPCA, segundo a calculadora do IBGE.