Receita Federal esclarece tributação sobre aluguel de Bitcoin e criptomoedas

De acordo com o site Declarando Bitcoin, empresas optantes pelo Simples Nacional devem ficar atentas à classificação e tributação correta dessas transações, evitando problemas com o leão.

A Receita Federal publicou a Solução de Consulta COSIT nº 86/2024 no Diário Oficial da União esclarecendo a tributação sobre o aluguel de criptomoedas para empresas optantes pelo Simples Nacional. Este documento fornece diretrizes importantes para a correta aplicação tributária nessas operações.

A consulta em questão se originou de uma empresa do ramo que atua como locadora em um contrato de cessão temporária de uso de criptomoedas. A empresa, optante pelo Simples Nacional, recebe um pagamento fixo de 8% do montante locado em criptos mensalmente e questionou sobre a natureza tributária desses pagamentos.

Inicialmente, a Receita Federal reiterou que as soluções de consulta não validam as informações fornecidas pelo consulente, mas servem para esclarecer dúvidas sobre a aplicação da legislação tributária.

Em relação ao caso apresentado, foi necessário analisar se a atividade descrita é permitida sob o regime do Simples Nacional e, em caso afirmativo, sob qual anexo deveria ser tributada.

Tributação sobre o aluguel de criptomoedas

A análise concluiu que os ‘criptoativos’, sendo bens incorpóreos e móveis, não se enquadram na categoria de locação de bens imóveis próprios, cuja locação é vedada ao Simples Nacional.

Além disso, foi esclarecido que a cessão de criptoativos fungíveis, como descrito, não se configura como locação nos termos tradicionais, nem como arrendamento mercantil ou administração de investimentos, atividades estas restritas pelo regime.

Importante ressaltar que os rendimentos obtidos pela empresa na forma de “aluguel” de criptoativos são, na verdade, juros remuneratórios decorrentes de um mútuo feneratício.

Portanto, tais receitas são excluídas da base de cálculo do Simples Nacional, sendo tributadas apenas pelo Imposto de Renda, conforme normativas específicas para rendimentos em aplicações financeiras.

Implicações para investidores e empresas

De acordo com o site Declarando Bitcoin, a solução de consulta da Receita ressalta a importância de entender a natureza jurídica e fiscal das operações com criptoativos.

Empresas optantes pelo Simples Nacional que realizam operações semelhantes devem estar atentas à classificação e tributação correta dessas transações, evitando problemas com o fisco.

Abaixo a SC COSIT 86/2024 na íntegra:

TRIBUTAÇÃO. REMUNERAÇÃO PELA CESSÃO ONEROSA DE CRIPTOATIVOS FUNGÍVEIS.

As receitas de juros remuneratórios pagos em razão de mútuo feneratício de criptoativos não integram a base de cálculo do Simples Nacional, mas são tributadas pelo imposto de renda a título de rendimento em aplicação de renda fixa.

Dispositivos Legais: Lei Complementar nº 123, de 2006, art. 13, § 1º, V; IN RFB nº 1.585, de 2015, art. 47, II.

Trata-se de consulta sobre interpretação da legislação tributária relativa ao Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Simples Nacional).

2. A consulente afirma que é optante pelo Simples Nacional e que atua no ramo de “Outras atividades auxiliares dos serviços financeiros não especificadas anteriormente” (CNAE 6619-3-99). Ainda, aduz que celebrou um “contrato particular de cessão temporária (aluguel) de uso de protocolos digitais (criptoativos)”, com doze meses de duração. Na condição de “locadora”, informa ser remunerada mensalmente no mesmo criptoativo, a um valor fixo de 8% do montante locado. Por fim, apresenta os seguintes questionamentos:

2.1. se deve tributar os aluguéis mensais como receita de locação de bem móvel (Anexo III da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006)?; e

2.2. se “o valor recebido mensalmente de aluguel depositado na conta da pessoa jurídica tomará por base o montante total recebido e sobre esse valor será calculado o imposto do simples nacional”?.

3. Preliminarmente, cumpre lembrar que as soluções de consulta não convalidam informações apresentadas pela consulente – art. 45 da Instrução Normativa (IN) RFB nº 2.058, de 9 de dezembro de 2021.

4. Paralelamente à análise da questão formulada, de como tributar a receita em tela no Simples Nacional, é necessário verificar se a respectiva atividade desenvolvida pela consulente é permitida aos optantes pelo regime.

5. Histórica e reiteradamente, a Coordenação-Geral de Tributação (Cosit) vem afirmando que são ineficazes as consultas a propósito do correto enquadramento de determinada atividade na Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) – p.ex., Soluções de Consulta Cosit nº 46, de 19 de fevereiro de 2014; nº 97, de 25 de março de 2019; nº 402, de 5 de setembro de 2017; etc. Desse modo, sem avaliar a correção do código 6619-3/99, adotado pela consulente, vê-se que, em sua lista de descritores, encontra-se: “cessão temporária (locação) de criptoativos; serviços de”. E ele é citado no Anexo VII da Resolução CGSN nº 140, de 22 de maio de 2018, vale dizer: abrange atividades vedadas e permitidas aos optantes. Daí a dúvida: a atividade descrita pela consulente é vedada aos optantes? Em caso negativo, em qual Anexo deve ser tributada sua receita? Para responder a ambas as questões, é necessário definir a natureza do referido contrato e de seu objeto.

6. Ativos virtuais são uma representação digital de um ativo (token). Logo, são bens incorpóreos – art. 3º da Lei nº 14.478, de 21 de dezembro de 2022. Nessa condição, são bens móveis tais como os outros citados pelo art. 83 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil (CC). Sendo móveis, a cessão remunerada de ativos virtuais de propriedade da optante não configura locação de bens imóveis próprios, que seria vedada ao Simples Nacional pelo art. 17, inciso XV, da Lei Complementar nº 123, de 2006.

7. Criptoativos são ativos virtuais criptografados numa tecnologia de registros distribuídos (DLT), tal como o blockchain – art. 5º, inciso I, da IN RFB nº 1.888, de 3 de maio de 2019. Então, não são um programa de computador, na definição do art. 1º da Lei nº 9.609, de 19 de fevereiro de 1998. Logo, sua cessão não configura um licenciamento de software (art. 9º da Lei nº 9.609, de 1998) remunerado por royalties (Solução de Consulta Cosit nº 75, de 31 de março de 2023) que, no Simples Nacional, seriam tributados conforme o fator “r” (art. 5º-D, inciso V, c/c § 5º-M, inciso II, da Lei Complementar nº 123, de 2006; Solução de Consulta Cosit nº 222, de 26 de julho de 2019).

8. A consulente não informou a espécie de criptoativo que negociou – se foram tokens de pagamento, de utilidade ou referenciados a ativos (item 3 do Parecer de Orientação CVM nº 40, de 11 de outubro de 2022). No entanto, na definição, tanto do objeto contratual, quanto da remuneração à consulente, nota-se que os criptoativos em tela são quantificados em determinadas unidades, que não são individualizadas uma a uma. Ou seja, como qualquer token de padrão ERC 20 mas ao contrário dos non-fungible tokens (NFT), são bens fungíveis, nos termos do art. 85 do CC.

9. A consulta não versa sobre ganho de capital na venda do criptoativo (tratado na Solução de Consulta Cosit nº 214, de 20 de dezembro de 2021), tampouco sobre renda fixa de tokens de recebíveis (Ofício-Circular CVM/SSE nº 4, de 4 de abril de 2023), mas sobre remuneração por sua cessão temporária. Ora, como o criptoativo em tela é fungível (item 8, acima), sua cessão não configura a locação de que trata o art. 565 do CC, que só pode ser de bens infungíveis. Consequentemente, sua remuneração não configura aluguel (DINIZ, Maria Helena. Dicionário jurídico. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008. v. 1, p. 201).

10. Pelo mesmo motivo – a fungibilidade do objeto –, pode-se descartar também o leasing (caso a contribuinte tenha adquirido os criptoativos de terceiro) e o lease-back (caso tenha adquirido da própria empresa para a qual, depois, as cedeu) – Resolução CMN nº 4.977, de 16 de dezembro de 2021. Assim, caso não haja outro motivo para tanto, a mera cessão de criptoativos fungíveis não é suficiente para que a cedente seja considerada uma empresa de arrendamento mercantil, que seria vedada pelo art. 3º, § 4º, inciso VIII, da Lei Complementar nº 123, de 2006.

11. Como o cessionário não opera esses criptoativos no mercado em favor do cedente, não administra investimentos para ele. Portanto, essa atividade não caracteriza um gerenciamento de ativos (asset management), que também seria vedado pelo art. 17, inciso I, da Lei Complementar nº 123, de 2006. Com maior razão, não caracteriza uma corretagem ou distribuição de títulos e valores mobiliários, que seriam vedadas pelo art. 3º, § 4º, inciso VIII. Isso dispensa a discussão sobre se esse criptoativo é ou não um valor mobiliário (art. 2º, IX, da Lei nº 6.385, de 7 de dezembro de 1976).

12. Depósito bancário também não é, seja por não ter sido firmado com uma instituição financeira, seja porque seu objeto não é importância em dinheiro, com curso legal no país (DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 35ª ed. São Paulo: Saraiva, 2019. v. 3, p. 739). Logo, não incide na vedação do art. 3º, § 4º, inciso VIII, da Lei Complementar nº 123, de 2006.

13. Resta, portanto, configurar como contrato de mútuo feneratício pelas seguintes razões:

13.1. tem por objeto bens fungíveis (art. 586 do CC); e

13.2. a remuneração mensal fixa chamada de “aluguel”, na realidade, são juros (art. 591) pagos pelo Sistema Americano de Amortização, ou seja, periodicamente mas sem amortização proporcional do principal, que é integralmente restituído apenas ao final do prazo contratado.

14. Todavia, nessa condição de mútuo feneratício, os juros remuneratórios (que a consulente apresenta como “aluguéis”) são tributados por fora da base de cálculo do Simples Nacional em função do disposto no inciso V do §1º do art. 13 da Lei Complementar nº 123, de 2006:

Art. 13. O Simples Nacional implica o recolhimento mensal, mediante documento único de arrecadação, dos seguintes impostos e contribuições:

§ 1º O recolhimento na forma deste artigo não exclui a incidência dos seguintes impostos ou contribuições, devidos na qualidade de contribuinte ou responsável, em relação aos quais será observada a legislação aplicável às demais pessoas jurídicas:

V – Imposto de Renda, relativo aos rendimentos ou ganhos líquidos auferidos em aplicações de renda fixa ou variável;

15. Isso é aplicado em consonância com as normas relativas ao imposto de renda que incide sobre o rendimento em aplicação de renda fixa (art. 13, § 1º, inciso V, da Lei Complementar nº 123, de 2006). Nesse sentido, dispõe o art. 47 da IN RFB º 1.585, de 31 de agosto de 2015, que:

Art. 47. São também tributados como aplicações financeiras de renda fixa os rendimentos auferidos:…

II – pela entrega de recursos a pessoa jurídica, sob qualquer forma e a qualquer título, independentemente de a fonte pagadora ser ou não instituição autorizada a funcionar pelo Bacen;

III – nas operações de mútuo de recursos financeiros entre pessoas jurídicas ou entre pessoa jurídica e pessoa física;

16. Ainda que, eventualmente, não se considere determinado caso um mútuo de recursos “financeiros” (inciso III), o inciso II já permite a subsunção porque fala em:

16.1. entrega de “recursos”, que não se restringem aos financeiros;

16.2. “sob qualquer forma”, que inclui criptoativos;

16.3. “a qualquer título”, que inclui mútuo; e

16.4. prescindibilidade da participação de uma instituição financeira no negócio jurídico.

17. Com isso, fica prejudicada a segunda questão, tal como foi formulada pela consulente. Porém, afirma-se que:

17.1. a base de cálculo é o valor dos juros (art. 47, § 1º, inciso II, da IN RFB Nº 1.585, de 2015);

17.2. no caso de juros eventualmente acima do limite legal (art. 591 do CC), o art. 184 do CC manda conservar parcialmente o negócio jurídico (REsp 1.106.625/PR, 3ª T., j. 16.08.2011; AgRg no REsp 925.907/RS, 4ª T., j. 24.06.2014) e mesmo a parcela superior ao limite é tributável, uma vez que essa invalidade de direito privado seria irrelevante para fins tributários – art. 118, inciso I, da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional (CTN);

17.3. caso os juros sejam pagos em criptoativos, a tributação independe de sua prévia conversão em moeda fiduciária, como já foi explicado em caso de ganho de capital (Solução de Consulta Cosit nº 214, de 2021), devendo ser avaliados em dinheiro, pelo valor de mercado que 4 SOLUÇÃO DE CONSULTA 86 – COSIT PROCESSO tiverem na data de seu recebimento – art. 1.039 do Regulamento do Imposto de Renda (RIR), aprovado pelo Decreto nº 9.580, de 22 de novembro de 2018.

CONCLUSÃO

18. Diante do exposto, soluciona-se a consulta respondendo à consulente que as receitas de juros remuneratórios pagos em razão de mútuo feneratício de criptoativos não integram a base de cálculo do Simples Nacional, mas são tributadas pelo imposto de renda a título de rendimento em aplicação de renda fixa.

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Ana Paula Rabello
Ana Paula Rabellohttps://www.declarandobitcoin.com.br/
Contadora, Perita Judicial e Especialista em Imposto de Renda

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