Bitcoin: afinal, qual a razão da sua existência?

“Ainda bem que o povo não entende como o nosso sistema bancário e monetário funcionam. Se eles entendessem, eu acredito que haveria uma revolução amanhã antes do amanhecer” Henry Ford

As oscilações incessantes na cotação do bitcoin tem feito muita gente se perguntar se vale a pena se envolver com criptomoedas. E não estou me referindo a “investimento” em criptoativos. A diferença entre investimento e especulação é uma lição que o grande público tem aprendido rápido. 

Aprender o básico para poder operar com a novidade criptográfica já é um “custo operacional” relevante para quem quer se familiarizar com a web 3.0Raras são as pessoas que nunca cometeram erros ou perderam dinheiro com criptomoedas.

Mesmo nos círculos mais formais de San Francisco e Silicon Valley a frustração é a mesma que em qualquer outro lugar. Na verdade a mística que envolve o pessoal letrado em programação e desenvolvimento de software só ajuda a elevar a ansiedade ainda mais.

[lwptoc]

Eis a questão

Nesse clima de perplexidade uma questão tem sido levantada com muita frequência.

Afinal, qual é objetivo de tudo isso?  

Não pretendo esgotar o assunto ou estabelecer uma palavra definitiva. Pelo contrário, de tempos em tempos é importante voltar às origens e relembrar como chegamos até aqui.

“Aquele que controla o volume de moeda de um país passa a ser o senhor absoluto de toda indústria e comércio (…).” James A. Garfield. Presidente americano assassinado. Circa 1881.

Pra quê bitcoin?

A motivação por trás da criação de uma moeda digital, descentralizada e autônoma é libertar a parte real da economia do poder do Estado e do mercado financeiro. 

Esses agentes, representados pela elite governante e pelos tecnocratas, pouco contribuem com o “produto social”. Em contraste alguns podem argumentar sobre a imprescindível  necessidade do gerenciamento da riqueza e de organização da vida dos cidadãos. 

Para obter uma visão mais clara precisamos seguir os rastros da turma do Cypherpunks, especialmente Nick Szabo, o inventor dos smart contracts e do bitGold, um dos precursores do Bitcoin.

Segundo esse pessoal a mudança do “contrato social” só seria alcançada através do uso da criptografia e das tecnologias que promovem a privacidade. Portanto, o objetivo final da rede Bitcoin seria eliminar a dependência de um poder central que controla a emissão de dinheiro.

“Permita-me emitir e controlar o dinheiro de uma nação e pouco me importa quem faz as leis.” Mayer Amshcel Rothschild. Fundador da dinastia Rothschild 

Como assim?

Controlar a emissão de moeda seria uma oportunidade para a população reivindicar seu papel. Seria recuperar o poder decisório na elaboração das políticas fiscais e econômicas derivadas dessa atribuição do Estado e da Casa da Moeda. 

Toda vez que o governo, ou o banco central emite moeda o que se está emitindo é um título de dívida pública. No fim das contas, todos têm que pagar os juros sobre essa dívida e assim fazemos através do pagamento de tributos. 

Para pagar tributos a grande maioria da população tem que trabalhar e auferir renda. Em última análise, o simples uso do “dinheiro” nos transforma em subordinados de um soberano, só que versão iphone. 

O princípio

Lembremos que tributo é um conceito que engloba os impostos, as taxas e as contribuições de melhorias. Dentre esses tributos, os impostos são pagos sem nenhuma contraprestação por parte do Estado. 

O imposto é pago pela população simplesmente para manter a máquina pública, cargos, pensões vitalícias e os atuais padrões de saúde, educação e segurança. Sem entrar em detalhes, vale adicionar que o Estado não poderia montar esse esquema global sem a ajuda de outro protagonista: o banqueiro.

“Bancos criam crédito simplesmente aumentando o valor oferecido ao prestamista na sua conta corrente.” Paul Tucker, Presidente do Banco da Inglaterra 

O financiador das monarquias e das guerras, assim como do progresso econômico das nações é um agente importante nessa engenharia financeira. O banqueiro é o responsável por organizar o funcionamento da economia através do sistema monetário. 

Mas o banqueiro também precisa ser “remunerado” por sua contribuição. À ele o Estado concedeu a atribuição exclusiva de desempenhar duas atividades muito especiais: a criação de moeda escritural e a oferta de crédito. Para quem quiser entender mais sobre esse mecanismo de transferência da riqueza veja os termos: reserva fracionada, depósitos compulsórios e quantitative easing

“Quando alguém assina um cheque, esse alguém precisa ter dinheiro na conta para cobrir o valor prometido, mas quando o banco central faz o mesmo não há conta corrente para debitar a promessa de pagamento. Quando o banco central assina um cheque, na verdade ele está emitindo moeda.” Federal Reserve Bank of Boston, livro ‘Putting It Simply’ (1984)

Sem economiquês 

Moeda escritural ou “fractional-reserve banking” permite que os bancos “criem” moeda sem nenhum lastro. Talvez por isso a expressão “moeda fiat” tem se tornado tão popular. 

Isso porque um dia alguém descobriu que para manter um banco em funcionamento, o banqueiro não precisa manter a totalidade das suas obrigações perante os depositantes em “espécie”. 

Errata – De acordo com a fonte consultada o testemunho original dado no Congresso americano cita: “Money is gold, and nothing else.” J.P. Morgan, 1912. Tradução: Dinheiro é ouro, o resto é resto.

Assim como Deus criou a luz dizendo “Fiat Lux” (Gênesis 1:3), banqueiros ao redor do mundo tem criado impérios. O caso é ainda mais sério ao observar o Federal Reserve, o banco central americano. A “impressão” de moeda tem mostrado uma trajetória sem precedentes.

Toda justificativa é nobre. A emissão de veículos de crédito serve para estimular o setor produtivo. No entanto, Rússia e China notaram esse movimento e vêm comprando ouro como se não houvesse amanhã.

Entra em cena a criptomoeda

Quando se fala em bitcoin, a cripto-moeda, na verdade o que se propõe é uma revisão de todo esse ciclo de transferência e apropriação de valor através do débito. 

Uma moeda capaz de circular de forma distribuída elimina o papel do atravessador exercido pela compensação bancária, ou “clearing house”. Na rede Bitcoin, o algoritmo de consenso exerce essa função, e por isso cada “minerador” é remunerado através do pagamento de uma pequena taxa. Saiba mais sobre o funcionamento da rede Bitcoin clicando aqui.

“Se o débito não existisse no sistema monetário, o dinheiro simplesmente não existiria” Marriner Eccles, Presidente Fed, circa 1941

Além do mais, uma vez executada, a transação bitcoin não deixa saldos entre entidades. Como resultado o controle e oferta do crédito deixa de ser atribuição exclusiva do banco. A rede Bitcoin passa a ser o agente de custódia*.

E quando o controle da base monetária ocorre de forma autônoma (o número de bitcoins é limitado a 21 milhões), o Estado perde a prerrogativa de autoridade central na criação e oferta de moeda. Trocando em miúdos, o Estado não pode mais contrair dívida em nome de terceiros, a população.

“O banco se beneficia de juros sobre todo o dinheiro que cria do nada.” William Paterson, Juiz da Suprema Corte americana, circa 1745

Será mesmo?

A aceitação generalizada de bitcoins teria efeitos na maneira como o Estado administra suas receitas. Num mundo sem CPF ou CNPJ o recolhimento de impostos seria no mínimo diferente. Pra não dizer, desafiador.

Ao conceber a rede Bitcoin, Satoshi Nakamoto talvez tenha imaginado um lugar onde a emissão de títulos de dívida pelo Estado não teria justificativa. Se o Estado não detém o controle na emissão de moeda, reformas orçamentárias teriam outro significado. 

Sabemos que a criptomoeda bitcoin preenche todos os requisitos para ser usado como moeda: reserva de valor, unidade de medida, meio de troca. E desde que a infra-estrutura continue funcionando bitcoins são transferíveis, divisíveis, uniformes e têm oferta limitada. 

“Ainda bem que o povo não entende como o nosso sistema bancário e monetário funcionam. Se eles entendessem, eu acredito que haveria uma revolução amanhã antes do amanhecer” Henry Ford

Não podemos especular como será a organização do Estado no dia em que bitcoins serão amplamente aceitos. O que sabemos é que por mais de 200 anos, desde a formação das primeiras repúblicas democráticas modernas, indivíduos têm cerceado, ou impedido, a população do controle do dinheiro.

A rede Bitcoin deixa essa mensagem clara e ao mesmo tempo oferece uma alternativa. Para o cidadão comum pagador de impostos ver uma atuação mais responsável do seu representante seria reivindicar seu papel. Ou seja, o indivíduo passa a ser o ator central da sociedade através do voto. Quando o poder emana do povo, o servidor público não se chama governante.  

* Existem várias iniciativas envolvendo custódia e títulos futuros lastreados em cripto ativos (veja Bakkt). 

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Pascual Arrechea
Pascual Arrecheahttp://www.arrechea.net
Economista, contador, especialista em blockchain Investigando a tecnologia blockchain, RPAutomação, e o mercado de trabalho em tempos de Internet 3.0. Quero dividr meus achados e pensamentos pra tentar entender a tal criptoeconomia. “Play is just another version of work” Ray Kurzweil, The Singularity is Near

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