Essa é, sem dúvidas, a pergunta que mais recebemos após a aprovação da Lei nº 14.754, que dispõe sobre a tributação de aplicações financeiras no exterior. Neste artigo, vamos analisar as possíveis respostas para essa questão.
E por que não vamos responder a essa pergunta de forma definitiva? Simplesmente porque esse ponto ainda depende da regulamentação da Receita Federal. É isso que diz o § 3º do art. 3º da nova Lei:
“O enquadramento de ativos virtuais e de carteiras digitais como aplicações financeiras no exterior constará da regulamentação da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Fazenda.”
Portanto, realizar qualquer afirmação seria precipitado da nossa parte, pois ainda não temos todas as informações necessárias. Contudo, isso não nos impede de teorizar sobre os possíveis efeitos e casos. Para responder a essa pergunta, enxergamos três cenários possíveis para o caso em que estamos tratando, que é transferir criptos de uma corretora estrangeira para uma corretora nacional e vender até 35 mil.
Regime de apuração único
A nova lei trata das aplicações financeiras no exterior, o que nos leva a acreditar que as criptomoedas negociadas em corretoras nacionais estariam fora do escopo dessa legislação.
Contudo, a definição da localização dos criptoativos, que são registros em um livro-razão distribuído, requer critérios específicos que ainda serão definidos pela RFB:
Será considerado o local onde o ativo foi emitido?
No caso de proof of work, o local onde foi minerado?
O local de aquisição?
O local em que foi feita a alienação do criptoativo?
Para contornar essa discussão da localização, uma possibilidade seria qualificar automaticamente os criptoativos como localizados no exterior. Se os ativos que se enquadrem na definição de ativos virtuais estiverem automaticamente sujeitos à lei, teríamos um regime de apuração único.
Nesse contexto, a transferência de criptoativos, seja de uma corretora estrangeira para uma nacional ou vice-versa, não implicaria em diferenças tributárias.
Por exemplo, a transferência de criptoativos da Binance (corretora estrangeira) para uma corretora nacional não geraria imposto mas a venda subsequente estaria sujeita à tributação de 15% sobre o ganho, mesmo que o total alienado não ultrapasse 35 mil no mês.
Regime de apuração distinto: Nacional x Exterior
Neste cenário de duas apurações, teríamos regras distintas para criptoativos localizados no Brasil e no exterior. A Receita Federal precisaria definir critérios claros para determinar a localização dos criptoativos. Talvez o mais lógico seja utilizar a localização do prestador de serviço de ativo virtual.
Entretanto, isso ainda causaria dúvidas sobre como seria tratada a operação de compra de criptoativos em uma corretora estrangeira e venda em uma nacional. Seria aplicada a regra de ganho de capital nacional ou a regra de aplicações financeiras no exterior?
Para este caso, temos dois cenários possíveis:
A transferência de criptoativos do exterior para uma corretora nacional é considerada um resgate de aplicação financeira do exterior, gerando imposto sobre os ganhos acumulados até esse momento. A venda subsequente na corretora nacional estaria sujeita às regras de ganho de capital, permitindo a isenção de até R$ 35 mil. No entanto, o imposto já teria incidido na transferência da corretora estrangeira para a corretora nacional.
A transferência de criptoativos do exterior para uma corretora nacional não gera imposto. A venda dos ativos na corretora nacional estaria sujeita às regras de ganho de capital, com a possibilidade de isenção para vendas de até R$ 35 mil. Assim, seria possível realizar a transferência e venda sem incidência de imposto, desde que o total vendido no mês não ultrapasse R$ 35 mil.
Além desses, existe também a possibilidade de que a transferência inter-corretoras seja considerada um fato gerador de imposto, independentemente de ser uma transferência entre corretoras no exterior. Isso significa que qualquer movimentação de criptoativos entre diferentes plataformas de negociação poderia acionar a incidência tributária sobre os ganhos acumulados até o momento da transferência.
A definição final dependerá da regulamentação específica da Receita Federal. Novas informações ou mudanças na interpretação da lei poderão levar a outros cenários. Uma coisa é certa: esta regulamentação é uma das mais aguardadas e terá grandes implicações, afetando a estratégia de muitos investidores.