A personalidade de um Bitcoinheiro

Esse estudo sobre personalidades me faz pensar que a adequação da linguagem de acordo com o público é algo que, como comunidade, nós precisamos estar mais atentos.

Uma coisa que sempre chamou a minha atenção desde que eu caí na toca do coelho é como a personalidade dos bitcoinheiros tende a ser parecida. O Bitcoin seleciona determinados padrões de comportamento, atraindo pessoas com determinadas características e repelindo outras com características diferentes. 

Eu sempre reparei isso no Bitcoin Twitter, mas nunca tinha pensado mais profundamente a respeito. Uma sequência de publicações do Brandon Quitten fez todo sentido pra mim e elucidou a questão de “o que faz algumas pessoas entrarem na toca do coelho enquanto outras pessoas evitam a toca a todo custo? O que leva alguém a seguir o coelho branco (follow the white rabbit)?”

[lwptoc]

“Siga o coelho branco”
“Siga o coelho branco”

O Teste de Myer Briggs 

Todos nós já vimos diversos testes de personalidade em revistas e jornais. Existem uns  que são mais sérios, outros que são menos. E com certeza eles são em parte pseudociência e se aproveitam do instinto humano de querer fazer parte de um “nós”, de ter um bando.

Dois testes de personalidade que são reconhecidos e amplamente adotados são os testes de Myer Briggs e o RIASEC. O RIASEC é o teste que os alguns orientadores profissionais que eu conheço utilizam no seu dia a dia. Já o Myer Briggs é o mais conhecido e utilizado em empresas e na internet de maneira geral. O texto vai focar só no Myer Briggs, mas o pensamento com certeza é extrapolável e enquadra outros tipos de testes.  

O teste de Myer Briggs divide as nossas personalidade em 5 características principais e a partir dela constrói os arquétipos de cada personalidade.  Essas características são:

  • Mente – mede como você se relaciona com seu ambiente, você é introvertido ou extrovertido?
  • Energia – mede como vê o mundo e processa informações, você é uma pessoa intuitiva ou observadora?
  • Natureza – mede como a gente toma decisões e lida com emoções, de forma racional ou sentimental?
  • Táticas – como a pessoa aborda o trabalho, se planeja e toma decisões? De uma forma julgadora ou exploradora?
  • Identidade – quão confiante a pessoa é enquanto ela vive a vida? Ela é uma pessoa assertiva ou cautelosa? 

Ou seja, dependendo de como a pessoa é nessas diferentes categorias ela é classificada de uma maneira diferente. 

Os meus resultados e a validade desses testes

Eu já fiz esse teste algumas vezes na vida e meus resultados sempre variaram entre INTJ, INTP ou ISTJ. São personalidades até que parecidas e pegando a “média” delas, vamos dizer pelo resto deste texto que eu sou INTJ, conhecida como “arquiteto”. 

Isso significa que eu sou introvertido (mente), intuitivo (energia), pensante (natureza), julgador (tática) e assertivo (identidade). Lendo mais sobre as características do ‘arquiteto”, eu realmente me identifico com essa personalidade.

Contudo, eu também me identifico com a INTP (“lógico”) e com a ISTJ (“logístico”), o que já me levanta uma pulga atrás da orelha: se eu me identifico com várias, será que esses testes não só um tipo de zodíaco em que nós procuramos pertencimento e nos identificamos com várias coisas sempre?

Tanto o arquiteto como o lógico são personalidades “analistas” enquanto o logístico é um “sentinela”.

Outra pulga atrás da minha orelha que sempre aparece quando estou preenchendo esses testes é a seguinte: eu respondo com a minha visão sobre mim mesmo ou com a visão que as outras pessoas têm de mim (e que eu não necessariamente concordo)? Será que a minha visão de mim mesmo é imparcial?

Ao mesmo tempo, será que os outros realmente me conhecem e sabem as minhas motivações? Parecem dúvidas bestas, mas isso com certeza coloca em xeque toda a validade destes testes e justificam nós enxergarmos eles só como uma brincadeira e não como algo científico.

Imagine uma pessoa que preencha três testes desses de acordo com a) como ela acha que as pessoas veem ela, b) como ela se vê e c) tentando ativamente ser “imparcial” e fazer uma balanceamento entre a) e b). Essa pessoa vai ter três resultados diferentes, ou seja, três personalidades. 

Ok, com essas ressalvas feitas, vamos para a parte mais divertida do texto. 

As personalidades mais comuns na comunidade

Bom, como eu disse acima, o que me levou a pensar nesse assunto foi este fio do Brandon Quintten no Twitter. Ele fez uma enquete no seu perfil sobre qual personalidade de Myer Briggs seus seguidores eram e obteve mais de 500 respostas. Essa é uma amostragem pequena e enviesada, pois nem todos os bitcoinheiros usam o Twitter.

Então é possível argumentar que essa amostragem representa bem mais os bitcoinheiros do Twitter do que todos os bitcoinheiros do mundo. Mas os dados são muito interessantes e acredito que são sim representativos da maioria dos bitcoinheiros que eu já conheci até hoje. E provavelmente uma amostragem significativa dos maximalistas utilizam o Twitter. 

Vamos aos dados:

  • 25% da população geral (normies + bitcoinheiros) é ISFJ (“defensor”) ou ESFJ (“consul”) e 0% dos bitcoinheiros se identificam com esse tipo de personalidade. Essas personalidades são “cordiais, responsáveis e reservadas” e realmente não se encaixam com a visão de mundo de um bitcoinheiro. 
  • A população geral está bem dividida entre introvertidos (50%) e extrovertidos (50%), enquanto que entre os bitcoinheiros do Twitter a maioria é introvertida (73% contra 27% de extrovertidos).
  • Existem duas personalidades que representam mais da metade dos bitcoinheiros (51%) e que são pouco representativas (5.4%) na população geral. São elas: 1) INTP (os lógicos), que representam 3.3% da população geral e 22.3% dos bitcoinheiros e 2) INTJ (os arquitetos), que representam 2.1% da população geral e 29% dos bitcoinheiros. Essas personalidades são “altamente analíticas, criativas, lógicas e valorizam o conhecimento” e são praticamente 10x mais comuns entre os bitcoinheiros do que entre a população normal (51% x 5.4%).

  • Como alguém que sempre oscila de resultados entre os INTP e INTJ, essa conclusão me pareceu interessante e fez bastante sentido. Isso explica porque eu me sinto tão à vontade no meio dos bitcoinheiros: a metade deles é realmente que nem eu! Temos as mesmas características básicas de personalidade, o que permite que nos conectemos melhor. 

Personalidade dos shitcoinheiros?

O que me fez ficar curioso. São os bitcoinheiros são tão parecidos (em média), será que essa mesma verdade vale para os shitcoinheiros? Será que eles possuem características fundamentais que os façam se identificar com determinado tipo de visão de mundo e comportamento?

Eu lancei essa pergunta no Twitter e tiveram respostas legais. A melhor síntese pros propósitos deste texto foi essa do Dov

Amor > Razão ?

Coração > Cérebro ?

Hoje > Amanhã ? 


Ele instintivamente acertou traços de pessoas “cordiais e responsáveis”, as personalidades ausentes entre os bitcoinheiros. São pessoas que têm dificuldade de falar verdades duras. Elas provavelmente preferem dourar a pílula ao invés de serem precisos na linguagem. 

Eu fiquei pensando sobre isso também. Não encontrei nada de dados e o ideal seria conseguir fazer uma pesquisa com os “maxis de Ethereum” ou de DeFi e NFTs (eles existem?) e outros shitcoinheiros para ter uma visão mais completa. Mas minhas inferências (sem nenhum embasamento) são que o resto da comunidade “cripto” terá uma porcentagem maior das personalidades que estão sub representadas entre os bitcoinheiros.

A partir desta inferência e alguma observação, eu extrapolo que eles acreditam que a preservação dos sentimentos e o bem estar de todos é mais importante do que a busca pela verdade. 

Pegando o vocabulário do LaserHodl, são os “safe space maxis”, ou maximalistas de espaços seguros e protegidos. O mundo em plástico bolha. A aceitação e a empatia são os valores mais fortes. Algo como “a união faz a força” e “vamos todos nos abraçar”.  

Mas isso são só extrapolações, o ideal seria conseguir fazer o mesmo teste de personalidade tanto com bitcoinheiros maximalistas e shitcoinheiros brasileiros para ver quais seriam os dados.

Então, se quiserem, façam esse teste aqui e me mande seu resultado neste formulário aqui. Daqui alguns meses eu pretendo analisar esses dados e ver quais são as características de quem investe em bitcoin e em criptomoedas aqui no Brasil.

Vitalik e outros fazendo a dança do texugo na abertura de uma conferência em 2018
Vitalik e outros fazendo a dança do texugo na abertura de uma conferência em 2018

Personalidades e a adoção do Bitcoin

Curva de adoção

Este pensamento de personalidades sub representadas entre os bitcoinheiros também gera outras reflexões. 

Atualmente, ainda estamos em um estágio bem inicial da curva de adoção do Bitcoin como tecnologia. Se a gente considerar o modelo padrão de adoção, ainda devemos estar entre os inovadores e os primeiros usuários.

Ou seja, nem 15% da adoção do Bitcoin já ocorreu. De fato, dependendo dos critérios usados para adoção, o número pode variar entre algo 200 milhões (dado que leva em conta os curiosos que compraram menos de 1% da sua carteira de investimento) até 250 mil (estimativa do Croesus para o número de bitcoinheiros maximalistas que existe no mundo). 


Esses 250 mil parece um número bem conservador, mas na minha opinião ele é o mais realista. Isso porque quem tem 1% ou mesmo 5% do patrimônio em Bitcoin não deveria ser realmente considerado como “adoção”. Essa pessoa ainda está utilizando outro padrão monetário e utilizando o Bitcoin como “hedge”, ou seja, ela ainda não entendeu e adotou o padrão Bitcoin de fato. 

Faz sentido que a adoção do Bitcoin esteja ocorrendo de forma seletiva e que os primeiros usuários (entusiastas em tecnologia e visionários) apresentem determinados perfis de personalidade (no caso do Bitcoin, são INTP e INTJ). Estes grupos de entusiastas de tecnologia e visionários possuem características de personalidade bastante diferentes do restante da população. 

O Abismo

Um conceito relacionado a curva normal de adoção é o chamado “abismo”, que ocorre entre os primeiros usuários e o restante da população. Esse abismo é relacionado justamente as diferenças psicológicas e sociais entre estes dois grupos. 

Os primeiros usuários são visionários em busca de mudanças revolucionárias. Eles veem um problema com o status quo e desejam ativamente adotar tecnologias que consertem isso. Eles estão dispostos a assumir grandes riscos para impulsionar mudanças sociais de 0 para 1.

Por outro lado, os usuários da maioria inicial são pragmáticos e avessos ao risco. Eles estão procurando soluções incrementais e confiáveis. A maioria inicial não é influenciada pelos primeiros usuários, pois são de tribos fundamentalmente diferentes, o que gera o abismo. 

Não parece uma extrapolação muito arriscada dizer que as pessoas do outro lado do abismo são justamente os grupos que estão menos representados na comunidade bitcoinheira.

Essas outras personalidades, em média,  não falam a nossa língua e não fazem parte da nossa tribo. Elas não possuem o nosso ethos e preferem uma comunicação sensível e harmoniosa em detrimento de uma comunicação que priorize a verdade, por mais áspera que ela seja. 

Intuitivos X Observadores


É interessante notar que o traço mais comum entre os bitcoinheiros é o “N” no segunda letra, que significa que a nossa “energia” (ou seja, como a gente processa as informações do mundo) é intuitiva e não observadora. 

Essas duas características são utilizadas para descrever o que as pessoas têm mais probabilidade de fazer com as informações coletadas do mundo ao seu redor. Os tipos de personalidade “Intuitiva” dependem de imaginar o potencial passado e futuro daquilo que elas observam.

Eles extrapolam cenários e hipóteses antes de conseguir chegar a uma decisão. Já as pessoas do estilo “Observador” estão mais interessadas em fatos observáveis e resultados mais diretos. Eles preferem evitar muitas camadas de interpretação sobre o que elas observam. Pessoas observadoras são mais pragmáticas e realistas. 

Intuitivos – “olhos no horizonte” – as pessoas com o traço intuitivo preferem exercitar sua imaginação enquanto buscam novas idéias e possibilidades. Essas pessoas vivem suas vidas cotidianas como qualquer outro tipo de personalidade.

Mas enquanto isso está acontecendo, suas mentes tendem a olhar para dentro e, ao mesmo tempo, focam suavemente em algum lugar além do horizonte. Suas vidas são de questionamento, investigação e conexão dos pontos no “quadro geral” das coisas. Intuitivos amam o teórico. Eles costumam perguntar: “E se?” e ponderar as possibilidades que o futuro pode oferecer.

Observadores – “faça o que funciona” – os Observadores estão mais em contato com o que ocorre na frente deles e no presente. Isso não significa que os tipos de personalidade Observadores não se importam com o passado e o futuro.

Mas eles veem ambos da perspectiva de como cada um influencia suas ações presentes. Isso os torna pessoas focadas e práticas. Eles principalmente enraízam seu pensamento no que é acionável, tangível e útil. 

Em uma pesquisa da Practical Mind, 91% daqueles com o traço intuitivo dizem que gostam de discutir diferentes visões e teorias sobre como o mundo poderia ser no futuro, em comparação com 55% daqueles com o traço observador.

Enfim, em média os bitcoinheiros atuais são intuitivos e os normies tendem a ser observadores. O que levanta diversas questões relacionadas à educação sobre o bitcoin e a adoção.

O Ponto da Virada

No sentido “seleção darwiniana de um bem monetário, pautada na teoria dos jogos” o Bitcoin provavelmente já ganhou. Uma mera comparação entre as suas características com as características de outros bens monetários como o ouro e o fiat ilustra isso. Esse fato faz com que muitos acreditem que o Bitcoin é inevitável.

Possivelmente ele até seja. Mas sempre existem vários caminhos possíveis para subir uma montanha, e nós ainda podemos tentar ajudar a determinar a forma com que essa adoção irá ocorrer. 

O livro “Ponto da Virada”, do escritor Malcolm Gladwell, fala sobre o que é necessário para fazer ideias viralizarem. O termo ponto de virada faz referência ao momento de não-retorno, quando as ideias pegam embalo e se propagam por conta própria.

O autor cita três fatores que são responsáveis por fazer ideias se propagarem além desse “ponto da virada”, que também pode ser visto como o “abismo” entre os primeiros 15% de usuários e os outros 85%.  Esses fatores são:

Regra dos Eleitos – os eleitos são as pessoas necessárias para dar início a uma dispersão viral. Esses eleitos não precisam ser muitos, só alguns poucos e bons já são o suficiente para criar um movimento. Existiriam 3 perfis entre os eleitos: 

  • Comunicadores – indivíduos com network variada e que constroem pontes entre as pessoas da sua rede. 
  • Experts –  indivíduos que consomem e distribuem informação no seu círculo social. Eles são o tipo de consumidor que compreendem os detalhes técnicos e sentem prazer em ajudar e instruir outras pessoas com o seu conhecimento.
  • Vendedores – são indivíduos carismáticos capazes de persuadir outros em suas decisões de compra e comportamento.

Fator de Fixação – O fator da fixação é fundamental para que a mensagem seja fácil de compreender, memorizar e transmitir. 

Poder do Contexto – Existe uma hora certa e um lugar certo para fazer as coisas. Sem o contexto adequado e o momento oportuno, a dispersão de uma ideia enfrenta ventos contrários e é dificultada. Uma frase que explica bem isso é que “texto sem contexto é pretexto”. 

O Funil de Vendas

Entre os bitcoinheiros, existem muitos comunicadores e experts, porém existem poucos vendedores. Pensando nisso, essa seção fará uma breve explicação sobre um conceito básico de vendas, o “funil de vendas”. 

O funil de vendas pode ser visto como a “toca do coelho” do processo de vendas. Ele separa as fases que um potencial cliente passa até efetuar uma compra. Esse tal funil de venda é segmentado conforme o cliente em potencial vai conhecendo mais um determinado produto a chance dele efetuar uma compra aumenta. 

Topo de funil – estágio de aprendizado e descoberta, quando o potencial cliente ainda está descobrindo que o seu produto existe. Neste momento que o problema que o seu produto resolve é apresentado ao potencial cliente. 

Meio de funil – estágio em que o cliente está prestando atenção e se educando, mas que ainda não tomou nenhuma decisão. Ele está considerando qual a solução mais adequada para o problema em questão.

Fundo de funil – estágio de decisão de compra. É quando o cliente realmente efetua a compra

Tanto os vendedores como as equipes de marketing desenvolvem estratégias de comunicação diferentes para cada estágio deste funil. Assim existem conteúdos mais simples para o topo do funil e conteúdo mais profundo e detalhado para quem já está mais próximo do fundo. 

 O estudo do Bitcoin também segue (ou pelo menos deveria seguir) esse padrão. Ou seja, é importante que existam conteúdos direcionados para cada estágio do aprendizado de um normie que esteja na superfície da toca do coelho. 

 

Estabelecendo pontes

Juntando essas últimas seções, temos que: o grupo dos 15% iniciais é composto majoritariamente por pessoas intuitivas, enquanto o grupo dos 85% possui mais pessoas observadoras.

Entre esses intuitivos nós temos os comunicadores e os experts. Eu interpreto que entre esses 15% iniciais, os bitcoinheiros possuem pouquíssimas pessoas com perfil de vendedor. Em média, nós preferimos uma verdade áspera do que uma meia verdade, o que não poderia ser mais diferente da personalidade de um vendedor carismático que consegue vender algo para as personalidades “cordiais e responsáveis”.

O poder do contexto atual é gritante, visto que “money printer go brrrr”. O fator de fixação, ou seja, a simplificação das narrativas e explicações para ajudar no início dos estudos dos normies, também já está bem amadurecido. Narrativas como “dinheiro incensurável” e “proteção contra a inflação” fazem um bom trabalho quando bem comunicadas, além, é claro, da tecnologia NGU que faz milagres. 

Ou seja, juntando o pensamento do Malcom Gladwell com a curva de adoção, nós podemos pensar que: 

  • Os próximos grupos não adotarão o Bitcoin pelas suas implicações filosóficas e sociais, eles adotarão o Bitcoin pela facilidade de uso. São usuários pragmáticos e não ideológicos.
  • Precisamos ter mais vendedores para atrair os outros tipos de personalidades e atravessar o abismo em direção aos 85% restantes. Ou pelo menos evoluir nossa narrativa. Ou, na linguagem comercial, o nosso discurso de vendas. 

Isso me leva a série de textos do Svetski sobre os bitcoinheiros serem os remanescentes. A tese central dessa série de textos (traduções para as partes 1, 2 e 3 aqui, aqui e aqui respectivamente) é que a adoção ainda está no estágio seletivo, onde os bitcoinheiros ainda estão encontrando e acordando seus semelhantes. A tese pode ser simplificada na visão de que “não é o trabalho de um leão acordar todas as ovelhas, mas sim acordar os outros leões adormecidos.” 

Isso faz sentido, visto que nós não estamos perto desses 15% iniciais de adoção antes do abismo. O fortalecimento do grupo de bitcoinheiros é importante e garantirá a preservação das qualidades do Bitcoin no futuro. Entretanto, mesmo que as massas não importem, ainda existem leões adormecidos (mesmo que em menor grau) nos outros tipos de personalidade que são sub-representados entre os bitcoinheiros. 

Nós precisamos pensar também que, se a adoção continuar seguindo a taxa de adoção atual, outras personalidades também entrarão no Bitcoin. E se elas não entrarem, nós perdemos. Então é do nosso interesse que elas entrem e encontrem um ecossistema mais heterogêneo.

Isto torna o Bitcoin ainda mais antifrágil, pois novos conceitos e ideias são gerados, testados, incorporados ou descartados.  Isso significa, na minha opinião, a necessidade de melhorar a nossa comunicação, de uma forma que os outros perfis de personalidade também consigam enxergar o valor do Bitcoin. 

O que me leva ao maximalismo tóxico: eu também sou culpado de perder a paciência às vezes, todos somos. A toxicidade de fato já protegeu muito o Bitcoin e seguirá protegendo. Mas nós precisamos entender que essa toxicidade se comunica melhor com os visionários e inovadores dos 15% iniciais, não com o restante da população.

É importantíssimo que a nossa mensagem não seja diluída, pois ela implica diretamente na proteção da imutabilidade do Bitcoin. Essa parte nós já estamos conseguindo fazer bem. Mas também é importante a criação de pontes para que as outras personalidades possam compreender o Bitcoin. 

Pessoas diferentes se identificam com partes diferentes da tese multifacetada que é o Bitcoin. O bitcoin é extremamente complexo e faz sentido introduzir cada tipo de personalidade por vias diferentes.

Certos textos e autores se comunicam melhor ou pior dependendo do tipo de personalidade da pessoa. Ou seja, eu não indicaria um texto do Svetski para um amigo comunista, eu indicaria os textos do Alex Gladstein. 

Aqui entra a reflexão sobre os “vendedores”. Os vendedores sabem que a sua mensagem precisa gerar um efeito específico nos seus possíveis clientes.

Dependendo do estágio que esse possível cliente está no funil de vendas, o vendedor adequa seu discurso. Ele tem um incentivo financeiro a conseguir construir o melhor discurso de vendas possível para converter os curiosos em clientes.

Esse estudo sobre personalidades me faz pensar que a adequação da linguagem de acordo com o público é algo que, como comunidade, nós precisamos estar mais atentos.

Como as personalidades dos 15% iniciais é diferente das personalidades dos 85% restantes, nós não devemos criar conteúdo somente que nos agrade, e sim conteúdos que nos ajudem a vencer o abismo e nos conectar com os usuários observadores e pragmáticos. 

Precisamos criar rotas para todas essas outras personalidades possam encontrar o bitcoin caso elas desejem. Quais personalidades? Todas possíveis, mais é mais.  Nós queremos converter o boomer que investe no mercado de ações, o esquerdista que quer acabar com as mazelas da desigualdade, pessoas não-técnicas que não entendem uma linha de código, o pescador tradicional em Jericoacoara e ou garimpeiro de ouro na Amazônia.

E eu não vejo isso como conflitante com o pensamento de adoção seletiva, uma vez que entender o Bitcoin sempre requererá muita prova-de-trabalho. Ou seja, mesmo em personalidades diferentes, ainda serão os remanescentes quem estarão se auto-selecionando. E nossa tarefa é sim acordar o máximo de remanescentes que estejam dormindo para conseguir fazer o Bitcoin superar o abismo e se tornar realmente imparável como fenômeno social. 

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Caio Leta
Caio Letahttps://bipa.app/
Caio Leta, PhD em Geologia, deixou a academia para se dedicar ao Bitcoin. Leta é o criador do projeto de educação Explica Bitcoin e autor do livro "O Mundo Mágico do Bitcoin". Trabalhou com pesquisa na Arthur Mining e atualmente atua como head de Pesquisa e Conteúdo na Bipa, uma plataforma digital de vanguarda que integra Bitcoin, USDT e Real, proporcionando uma experiência financeira unificada.

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