O Livecoins conversou nesta sexta-feira (19) com o desenvolvedor brasileiro Narcélio Filho sobre os recentes rumores de ameaça da computação quântica que movimentaram a comunidade bitcoin mundial na reta final de 2025, principalmente pela rede social X.
Uma das vozes que acredita em uma ameaça quântica para o bitcoin é Nic Carter, que publicou uma mensagem criticando o CEO da Blockstream, Adam Back, na quinta-feira (18).
Isso porque, Back disse que não há nenhum perigo iminente ao bitcoin, negando que os computadores quânticos podem quebrar o algoritmo da moeda descentralizada. Para Carter, contudo, os desenvolvedores deveriam levar o assunto mais a sério.
“É extremamente pessimista que muitos desenvolvedores influentes neguem categoricamente a existência de qualquer risco quântico. Isso é completamente diferente da filosofia proativa e paranoica que normalmente caracteriza o Bitcoin. Enquanto isso:
-Empresas estão captando centenas de milhões de dólares para construir sistemas de controle de qualidade capazes de decifrar as regras do ECC.
-A mera existência do bitcoin está acelerando o desenvolvimento do controle quântico.
-A inteligência artificial está acelerando as descobertas em matemática e física.
-O governo dos EUA planeja descontinuar os algoritmos de criptografia clássicos até 2030 e proibi-los completamente até 2035.
-Corrida armamentista quântica em pleno andamento entre os EUA e a China“, disse Carter no X na quinta-feira (18), marcando o comentário de Back que negava o risco.
O pensamento de Carter, entretanto, é compartilhado pelo brasileiro Narcélio que conversou com a reportagem. Ele acompanha a área quântica há alguns anos e estudou o tema com interesse durante todo o ano de 2025, lendo livros, interagindo com comunidades e participando de cursos atualizados.
“Não é iminente, mas a comunidade bitcoin tem que se cuidar. Satoshi Nakamoto deixou muitos erros no código que devem ser corrigidos e com ameaças mais urgentes“, disse Narcélio ao ser questionado sobre a necessidade de “correr contra o tempo” em busca de uma defesa quântica.
“O Banco do Brasil tem proteção contra ameaça quântica, o bitcoin não”
Ele lembra que a ameaça quântica é uma realidade que avança rapidamente, visto que há cinco anos haviam poucos estudos sobre.
Em 2025 foi comemorado 100 anos de física quântica e a ONU declarou como sendo “O ano das ciências e tecnologias quânticas“, promovendo eventos pelo mundo. O fato contribui para que investidores de bitcoin temam mais o avanço da tecnologia.
Além disso, a própria Cloudfare sinalizou que 51% dos sites que utilizam seu serviço já contam com proteção do tipo. “O Banco do Brasil já tem proteção pós-quântica e o bitcoin não“, destaca o desenvolvedor bitcoiner.
De qualquer forma, ele lembra que para 2026 não é uma ameaça tão séria assim, ainda que o futuro mude em um ritmo acelerado.
Muita gente fala sobre o assunto sem muito conhecimento técnico, o que atrapalha as discussões para os mais leigos. “Os computadores quânticos de hoje ainda não fazem nada de especial, mas nos próximos anos pode escalar exponencialmente“, destacou o brasileiro.
Contudo, ele lembra que o bitcoin e a computação quântica são dois temas muito complexos de se discutir, e qualquer mudança no algoritmo poderia demorar anos, visto que não há uma empresa ou dono do BTC para implementar as mudanças de forma mandatória. “Discutir computação quântica não é fácil, e o bitcoin também é muito complexo. Qualquer mudança no código principal pode demorar anos“, diz.
“Quebrar o bitcoin é muito pior que bancos”, sugere
Em conversa com a reportagem, Narcélio Filho ainda lembrou que não se compara os riscos que uma quebra do protocolo bitcoin teria em relação aos bancos.
Isso porque, uma quebra nos bancos seria muito mais fácil de se corrigir, com valores rapidamente congelados pelas instituições e o culpado sendo preso.
Já no caso de uma quebra ao bitcoin, o prejuízo seria muito mais sério e com impacto real em grandes empresas e bilionários, visto que a tecnologia descentralizada necessita de consenso para reagir a eventuais ataques. “O incentivo existe e isso é um fato“, destacou.
Desenvolvedores do bitcoin se preocupam com o tema?
Questionado se tem percebido movimentações interessantes dos desenvolvedores principais do Bitcoin para um mundo de proteção aos algoritmos quânticos, Narcélio declarou que o Core não se movimentou muito publicamente.
Contudo, alguns desenvolvedores já se movimentam com a criação de soluções de proteção, como Jonas Nick da Blockstream, que desenvolveu uma assinatura pós-quântica no dia 8 de dezembro de 2025, com apenas 324 bytes.
“Não tenho visto discussões específicas do Core sobre ameaça quântica, mas desenvolvedores do Bitcoin já começaram a apresentar soluções muito interessantes“, destacou o desenvolvedor.
“Quebrar o bitcoin com computação quântica é uma ótima propaganda para qualquer empresa”
Uma das preocupações de Narcélio Filho sobre a ameaça quântica é o incentivo financeiro e de marketing que move as empresas de computação quântica a atacarem a rede bitcoin, mesmo que para fins de testes.
De acordo com ele, qualquer negócio que conseguir um impacto na rede pode se beneficiar com a demonstração tecnológica, e inclusive levar a cotação do bitcoin para R$ 0,00.
Ele lembra que um estudo de pesquisadores chineses já apresentou uma arquitetura em agosto de 2025 que, se implementada em um hardware funcional, poderia quebrar o bitcoin. Contudo, como o equipamento ainda não foi construído, ainda não é possível saber se o experimento teria sucesso de fato.
De qualquer forma, Narcélio indicou que os computadores quânticos ainda possuem dificuldades de funcionar por mais de algumas horas, e a execução dos algoritmos apresenta erros.
“São dois pontos: 1) os computadores quânticos não têm qubits suficientes para a execução dos algoritmos e 2) não conseguem se manter coerentes por tempo suficiente para fazerem os cálculos“, destacou Narcélio. Ou seja, por hora o bitcoin segue protegido e sem a iminência de sofrer um ataque deste tipo no curto prazo.
“Existem vulnerabilidades conhecidas no bitcoin mais graves, mas ameaça quântica ainda merece sua atenção”
O brasileiro destacou ainda outros ataques igualmente preocupantes que poderiam ocorrer no curto prazo para o bitcoin.
O mais grave em sua visão é o “Worst case block validation time“, que faria com que a rede parasse por alguns minutos e nodes mais lentos por mais de uma hora. A ameaça, contudo, é conhecida desde 2019 por um bip e ainda não causou danos.
Outro caso seria a mineração de todos os bitcoins restantes (uma possível vulnerabilidade conhecida desde 2011), com uma suposta união dos mineradores. Uma outra vulnerabilidade menos grave seria o chamado Merkle Tree Atack (conhecido há anos também).
Assim, ao que tudo indica, o ecossistema de desenvolvimento do bitcoin tem muito o que trabalhar para resolver problemas antigos e já conhecidos, antes de se preparar para a era quântica, que pode sim chegar, em sua visão.
“Não é um FUD total, eu me preocupo e o assunto merece mais atenção sim. Falhas antigas ainda não foram corrigidas, mas não se pode desdenhar da computação quântica“, finaliza.
“Quebra de curva elíptica com computador quântico da IBM em 2025 me chamou atenção”
Ele lembrou que em novembro de 2024 participou de uma live sobre o tema de ameaça quântica e o possível fim do bitcoin. O desenvolvedor declarou que as ideias debatidas naquela ocasião permanecem praticamente iguais e como ele se dedicou a estudar mais sobre o assunto após o evento, ele indica que sua apresentação explicou bem os fundamentos para quem deseja conhecer mais sobre o tema (vídeo ao final).
Mesmo assim, um estudo de 2025 conseguiu quebrar uma chave elíptica pequena de 5 bits com computador quântico de 133 qubits da IBM.
A situação é uma das que mais lhe chamou atenção no ano de 2025 para os testes já em andamento, ajudando a entender que não é um simples “FUD” (sigla para medo, dúvida e incerteza em inglês).
Para Narcélio, este é um artigo que comprova um avanço no quesito ameaças a quebra de criptografia com computação quântica desde a sua apresentação no ano anterior.