Embora algumas pessoas façam críticas rasas ao Bitcoin que são facilmente refutadas, outras conseguem ser mais profundas e abordar assuntos de interesse global para melhorar o Bitcoin.
Devido a sua natureza descentralizada, qualquer pessoa pode propor mudanças que melhorem o projeto, que completa, neste domingo (31), 13 anos desde que Satoshi Nakamoto apresentou o whitepaper (livro branco) ao mundo.
Dentre os pontos mais abordados em uma discussão ocorrida no Reddit estão o ceticismo do uso do Bitcoin como moeda, pontos negativos em relação a mineração da forma atual e uma carência de não ser uma moeda 100% anônima. Aqui estão estas críticas, de forma detalhada.
Bitcoin como moeda e as três principais críticas
Três problemas são frequentemente citados quando se trata do Bitcoin como moeda: escalabilidade, volatilidade e inflação controlada.
O primeiro ponto, escalabilidade, também está ligado ao Bitcoin como um sistema de pagamento e causou uma das maiores divisões do Bitcoin em 2017, gerando o Bitcoin Cash. A discussão estava focada no aumento do tamanho dos blocos para permitir mais transações.
Segundo uma publicação de Roger Ver no BitcoinTalk em 2017, chamado de Bitcoin Jesus pelo seu suporte ao Bitcoin desde seu início, os “blocos cheios, altas taxas e backlog gerado pelos dois primeiros estão destruindo a vantagem do Bitcoin, fazendo com que mais pessoas usem altcoins”.
Embora o Bitcoin tenha vencido a batalha contra o Bitcoin Cash, desde a data desta postagem de Ver, março de 2017, a dominância do Bitcoin caiu de 67% para 45,5% na data de hoje. Tendo seu pico de baixa no início de 2018 com apenas 32,5%, sendo as altas taxas um fator contribuinte.
Como resposta, surgia a lightning network em sua versão beta em 2018. Esta solução de segunda camada permite que transações sejam feitas de forma barata e também rápida e sua adoção vem ganhando impulso no último ano, com a rede ultrapassando 3.000 BTC de capacidade.
Muito volátil?
Um dos mais recentes criticos do Bitcoin e que tem bagagem de sobra, Nassim Taleb é o escritor dos livros Cisne Negro, Antifrágil e Arriscando a Própria Pele, muito conceituado entre economistas apesar de seu mau humor no Twitter.
A volatilidade do Bitcoin deve-se ao seu livre mercado, seu preço não tem nenhuma proteção como “circuit breaker” presente em bolsas de valores, por exemplo. Todavia, para Taleb esta volatilidade faz com que o Bitcoin não possa ser uma moeda.
“Estou me livrando dos meus BTC. Porque? Uma moeda nunca deve ser mais volátil do que o que você compra e vende com ela.
Você não pode definir preços de mercadorias em BTC
Nesse aspecto, é um fracasso (pelo menos por enquanto).”
I've been getting rid of my BTC. Why? A currency is never supposed to be more volatile than what you buy & sell with it.
You can't price goods in BTCIn that respect, it's a failure (at least for now). It was taken over by Covid denying sociopaths w/the sophistication of amoebas
— Nassim Nicholas Taleb (@nntaleb) February 12, 2021
O ponto em que Taleb quer chegar é na verdade usar o Bitcoin como unidade de conta. Ou seja, chegar no McDonald’s e o preço do Big Mac ser fixo em 0,0001 BTC, o que ainda está bem longe da realidade.
Embora El Salvador tenha adotado o Bitcoin como moeda legal no país, mesmo que você use BTC para realizar o pagamento, os preços dos produtos ainda são definidos em dólar.
Apesar disso, como mostrado no vídeo acima onde uma pessoa compra um lanche pagando com bitcoin, é possível usar BTC como moeda. Caso o comerciante queira fugir da volatilidade, ele pode converter seus BTC por outro ativo de forma instantânea, a qualquer hora e dia, usando serviços oferecidos por empresas que já atuam neste setor.
Oferta controlada
A geração controlada de novas moedas do Bitcoin é um ponto abordado por alguns economistas que defendem que as pessoas tem menos interesse em circular um ativo que tende a valorizar, e eles podem estar certos.
Como o Real, ou qualquer outra moeda fiduciária, é imprimida descontroladamente pelo Estado, esta moeda vai perdendo seu poder de compra com o tempo. É a famosa inflação. Como destacado por Fernando Ulrich, economista austríaco e entusiasta do Bitcoin, o Real perdeu mais de 85% de seu poder de compra em 27 anos.
O real brasileiro bate mais um recorde atingindo seu menor poder de compra desde o início da moeda.
Depois do IPCA de setembro, o real perdeu 85,58% do seu poder de compra. Nossa moeda hoje compra apenas R$14,42 comparado a R$100 de 1994. https://t.co/2BGNeZc4kG pic.twitter.com/OItCdaWeEx
— Fernando Ulrich (@fernandoulrich) October 8, 2021
Já o Bitcoin, em seus 13 anos de existência teórica e prática, praticamente só valorizou. Em 9 de fevereiro de 2011, a moeda atingiu paridade com o dólar, 1:1, e hoje está valendo US$ 60.500,00.
Com isso, as pessoas tendem a querer usar menos BTC já que a “tendência é de alta infinita”, conhecida no mercado como a síndrome da pizza. Como prova disso, Mark Cuban revelou que as pessoas preferem pagar com DOGE em vez de BTC, pois assim como o Real, o Doge só tende a perder poder de compra.
Todavia, isso é um efeito psicológico, as pessoas estão gastando dinheiro da mesma maneira. Dinheiro que poderia ser usado para comprar BTC ou então fazer o caminho inverso, pagar em moeda digital e depois recomprar o montante utilizado.
Por fim, com o passar dos anos e maior entendimento pelo público de que existe um número finito de Bitcoin, e estamos relativamente próximo dele, o seu uso como reserva de valor está cada vez mais forte. Isso colocou o Bitcoin em um pedestal, sem concorrentes, ao contrário do Ethereum, ajudando-o para que fosse adotado por El Salvador e tantas outras pessoas e empresas no mundo.
Mineração do Bitcoin é um problema e vai acabar?
Ao falar de mineração há três assuntos muito comentados: a profissionalização da atividade, consumo de energia e a queda da recompensa.
Quantas pessoas que você conhece já mineraram Ethereum? E Bitcoin? A valorização do bitcoin deu início a introdução das ASICs em 2013, com isso a mineração começou a tornar-se um negócio profissional.
Embora existam mineradoras listadas na bolsa que mineram tanto ETH quanto BTC, é muito mais fácil encontrar uma placa de vídeo à venda, em qualquer lugar do mundo, do que uma ASIC para minerar bitcoin.
Antes mesmo das ASICs, o próprio Satoshi mostrou-se preocupado com este tema quando Laszlo apresentou seu trabalho, permitindo que a mineração fosse feita por GPUs, previamente a mineração era apenas por CPU.
“Não quero soar como um socialista, não me importo se a riqueza está concentrada, mas, por enquanto, obtemos mais crescimento [de adoção] dando esse dinheiro para 100% das pessoas do que dando para 20%. Além disso, quanto mais nós pudermos atrasar a corrida das GPUs, mais maduras as bibliotecas OpenCL se tornam e mais pessoas terão placas de vídeo compatíveis com OpenCL”, disse Satoshi Nakamoto.
Este ponto é difícil, embora o hashrate do Bitcoin tenha caído bruscamente após o banimento da China, ele rapidamente se reergueu conforme mineradores migraram para outros países como EUA e Cazaquistão.
Apesar disso, uma mineração caseira para todos, como apontado por Satoshi, poderia ajudar na adoção da moeda com usuários tendo um primeiro contato através da mineração, além de fortalecer a descentralização deste poder computacional.
Até o momento, não há nenhum plano de tentar barrar ASICs, pois muitas outras blockchains que dizem-se anti-ASICs na verdade não são tão eficazes.
Um exemplo é a Monero (XMR) cujo hashrate caiu 80% após um hard fork em 2018 que barrou ASICs (que em tese já estavam barradas). Ou seja, talvez a tentativa de barrar ASICs no Bitcoin viria a ser apenas uma falsa-segurança.
Atividade causa poluição?
Este assunto explodiu na mídia e nas redes sociais após Elon Musk comprar e aceitar BTC através da Tesla. Como a empresa diz-se à favor do meio ambiente e pressiona governos para barrar a produção de carros a combustão, ela foi muito criticada pelo fato da mineração de BTC consumir mais energia que muitos países.
Embora a Tesla tenha deixado de aceitar Bitcoin nas vendas de seus automóveis, a discussão continuou.
Alguns, como Vitalik Buterin, acreditam que o Bitcoin deveria adotar o Proof-of-Stake (PoS) assim como o Ethereum está planejando fazer, outros defendem que deve-se focar na busca por energia limpa, como energia geotérmica no caso de El Salvador e energia nuclear nos EUA. Vale lembrar que muitos países ainda usam carvão para gerar energia.
Já a Austrália, está propondo um desconto de 10% para mineradores que usem fontes de energia renovável. Por fim, esta pressão ecológica sobre o Bitcoin pode, na verdade, estar ajudando o mundo a mudar.
Queda da recompensa deve ser acompanhada pelo mercado
Conforme os halvings do bitcoin diminuem a recompensa por bloco pela metade, seu hashrate tende a diminuir conforme mineradores não tem tanto incentivo, ou tem até mesmo perdas, ao exercer a atividade.
Sendo o próprio preço do BTC a sua maior garantia de segurança já que as taxas tendem a ser cada vez menores devido a soluções de segunda camada como a lightning network.
Embora equipamentos de mineração apresentem melhorias na relação eficiência/consumo, poderemos ver uma menor descentralização do hashrate caso o preço não acompanhe, de forma reversa, seus halvings.
Fungibilidade
Por ser pseudoanônimo, a fungibilidade do Bitcoin ainda é pequena quando comparado a outras moedas mais anônimas. Aqui temos uma briga de prioridades, o Bitcoin pode ser usado como proteção contra o governo em ao menos dois pontos: economicamente e anti-censura.
Criptomoedas focadas em privacidade foram rapidamente banidas de vários países, como os EUA. Isso não seria bom para o Bitcoin em termos financeiros, com menos gente podendo comprá-lo para fugir da inflação, e também para a sua adoção.
Porém, ao não ser completamente anônimo, isso permite que empresas e governos vigiem as transações das pessoas. Este setor está tão em alta que a Mastercard adquiriu uma empresa de análise de transações, a CipherTrace.
Andreas Antonopoulous também explica os perigos das transações de Bitcoin não serem completamente anônimas, exemplificando que exchanges podem congelar seu saldo caso liguem estas moedas a algum tipo de crime. Todavia, no mesmo vídeo, Andreas explica que soluções estão sendo criadas para que o Bitcoin atinja um maior nível de privacidade.
Falando em governos, também vale destacar certo grau de dependência do Bitcoin sobre eles. Embora tenha sido criado e mantido até hoje sem a permissão de nenhum governo, seu preço ainda flutua muito com falas da China e dos EUA, as duas maiores potências, em relação a banimentos ou não.
Assim como a adoção por curso forçado em El Salvador, em vez de uma conscientização popular de que o Bitcoin é melhor que o dólar.
Debates construtivos são muito importantes e o whitepaper nos lembra isso
Por fim, lembro de um debate entre Nouriel Roubini, economista crítico do Bitcoin, e Arthur Hayes, ex-CEO da corretora BitMEX no qual se estendeu para o Twitter e envolveu CZ, CEO da Binance que rebateu o Roubini.
“Lol, quem é o idiota aqui? Um cara que constrói aquilo em que acredita? Ou Um cara que vai a conferências de criptomoedas apenas para chamar o bitcoin de fraude?”
Lol, who is the jerk here?
A guy who builds what he believes in?
Or
A guy who goes to crypto conferences just to call bitcoin a scam? https://t.co/NHSh0Z8VOO
— CZ 🔶 Binance (@cz_binance) July 2, 2019
Discussões sobre o Bitcoin são ótimas para o seu desenvolvimento e devem ser feitas, pois este é o seu ponto forte. A publicação do whitepaper do Bitcoin em 31 de outubro de 2008, por exemplo, foi um momento em que o criador da moeda digital pediu contribuições e críticas para tornar o projeto sólido, completando 13 anos hoje.
Apesar disso, vale lembrar que muitos destes críticos, como Roubini, não estão interessados em melhorar ou sequer entender o Bitcoin e os serviços que o rodeiam. Ou seja, muitos dessa turma não agregam nada.
E isto vale para outros críticos mais rasos como Jamie Dimon, que enquanto diz que o bitcoin não vale nada, sequer sabe como a matemática do Bitcoin limita-o ao número máximo de 21 milhões de moedas que serão emitidas no mercado.