Países do Brics apoiam a criação de uma criptomoeda própria; qual seria o impacto?

Os países do Brics – grupo de economias emergentes formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África de Sul – apoiam o desenvolvimento de um sistema de pagamento comum para as cinco nações e a criação de uma criptomoeda própria.

A afirmação foi feita por Kirill Dmitriev, head do Russian Direct Investment Fund – um fundo de investimentos criado pelo governo russo -, durante a reunião de cúpula de líderes do Brics, que ocorreu na semana passada em Brasília.

Os principais motivos para a implantação das novas tecnologias seriam a redução da dependência do dólar nas negociações e o aumento do uso das moedas próprias de cada país.

“Um sistema de pagamento eficiente do Brics pode incentivar pagamentos em moedas nacionais e garantir pagamentos e investimentos sustentáveis entre nossos países, que representam mais de 20% da entrada global de investimento direto estrangeiro”, disse Dmitriev.

Mas caso a ideia realmente seja colocada em prática, qual seria o impacto para os países membros e como isso afetaria o comércio internacional?

Novo sistema de pagamento e criptomoeda poderiam gerar sanções, diz professor

Fabiano Dalto, professor do departamento de economia da UFPR (Universidade Federal do Paraná), disse que, em termos tecnológicos, seria perfeitamente possível criar um novo sistema de pagamentos e uma moeda digital própria.

A questão que deve ser levada em consideração pelos países do Brics, disse ele, seria a possibilidade de os Estados Unidos criar sanções para o grupo.

Isso porque, disse Dalto, a Rússia incentiva um sistema próprio de pagamento e uma nova moeda por causa da disputa comercial que trava com o país norte-americano. Desde 2014, ano em que ocorreu a anexação da Crimeia, os EUA vêm aplicando entraves à economia de Vladimir Putin.

“Se o Brasil decidir aderir a um possível novo sistema, por exemplo, pode ser que surjam problemas com os Estados Unidos. Agora, se o país resolver não participar, pode ser que o comércio com Rússia e China sejam afetados. São apenas conjecturas, mas algo a se pensar”, disse.

Especialista diz que regras precisariam ser estabelecidas

João Alfredo Lopes Nyegray, professor de negócios internacionais da Universidade Positivo e consultor de internacionalização, também afirmou que a criação de uma nova criptomoeda e um sistema de pagamento não seriam complexos. Nyegray disse, no entanto, que as regras precisariam ficar claras para verificar a viabilidade da mudança.

“A dúvida é: qual seria o lastro da criptomoeda e em qual moeda poderia ser feita a troca? Seria na de um dos países do Brics? Se sim, seria complicado, porque a economia dessas nações não anda muito bem. O Brasil saiu de uma recessão agora e a economia da Rússia e a sul-africana, por exemplo, ainda estão patinando”, disse.

O comércio poderia melhorar?

Para Nyegray, uma possível criptomoeda poderia sim aproximar o comércio do Brasil com Rússia, Índia e África do Sul e aumentar a participação dos três países na balança comercial nacional.

Neste ano, por exemplo, o saldo comercial com essas três nações ficou deficitário em US$ 2,5 bilhões, segundo o Ministério da Economia. Ou seja: o Brasil importou mais produtos do que exportou.

“Uma nova moeda poderia mudar esse cenário, pois facilitaria o comércio e as transações e aumentaria os negócios”, falou Nyegray.

Já na opinião do professor Fabiano Dalto, da UFPR, o comércio com as três potenciais emergentes não seria afetado, pois esses países vendem e produzem itens semelhantes aos feitos no Brasil, diferente da China. “No caso do país asiático a situação muda porque por aqui temos muitas matérias-primas que não existem por lá”, falou.

Para efeito de curiosidade, a balança comercial brasileira registrou superávit de US$ 344,597 bilhões até outubro deste ano. Parte do resultado positivo foi puxado pela China, que é o principal parceiro comercial do Brasil. O país asiático teve 27,8% na participação do total de exportações no período.

Como os países do Brics lidam com as criptomoedas?

Apesar da afirmação do representante russo, o país não tem se mostrado muito aberto às criptomoedas. Em março deste ano, por exemplo, o parlamentar Nikolay Arefyev disse que os bitcoins teriam a capacidade de arruinar a economia porque “todo o fluxo financeiro seria retirado da Rússia”.

Em outubro, o governo russo bloqueou o acesso ao mais famoso site de critptomoedas do mundo, o que foi visto pela organização Repórteres Sem Fronteiras como censura.

No caso da China, a posição em relação às criptomoedas ainda gera dúvidas. No mês passado, por exemplo, o presidente do país, Xi Jinping, afirmou que aceleraria o uso da tecnologia blockchain, o que pode ter sido um dos motivos da alta do preço do bitcoin.

Na semana passada, no entanto, o tom do político mudou e ele disse que “mesmo que elas (criptomoedas) pareçam animadas e vibrantes hoje, amanhã elas podem estar na lista (de crimes)”.

A Índia também é reticente em relação às criptomoedas. Em junho, por exemplo, o país começou a discutir um projeto de lei para proibir o uso e a negociação de moedas digitais. A pessoa que gerar, manter, vender, transferir, emitir ou negociar bitcons e afins pode ser sentenciada a 10 anos de prisão, caso a lei seja aprovada.

O país “mais aberto” à nova tecnologia é a África do Sul. Por lá, apesar dos golpes, as criptomoedas são populares e o governo ainda não demonstrou ser contra as “criptos”.

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Lucas Gabriel Marins
Lucas Gabriel Marins
Jornalista desde 2010. Escreve para Livecoins e UOL. Já foi repórter da Gazeta do Povo e da Agência Estadual de Notícias (AEN).

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